Violência relacionada ao trabalho: o assédio moral

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9 de setembro de 2021

A partir da Revolução Industrial, o mundo do trabalho tem ocupado um espaço de destaque na vida de cada sujeito. Para além de questões econômicas e remuneratórias, o trabalho possui uma função importante de formação de identidade, de relações de pertencimento e de sentido para a vida do profissional.

Considerando essa importância, o contexto de trabalho pode atuar como fonte de saúde e bem-estar, mas também (e não é raro) de sofrimento e adoecimento tanto no que diz respeito à saúde física como mental de cada trabalhador. 

Nessa perspectiva, temos tido conhecimento da eclosão de situações que envolvem sofrimento no trabalho, destacando-se diversas modalidades de violência, que segundo a definição da OMS, consiste no uso intencional da força física ou do poder, mediante ameaça ou de forma efetiva, contra alguém. Ela pode ser classificada de acordo com os atos violentos, a saber: física, sexual, psicológica ou privação/negligência. 

Todas essas modalidades de alguma forma podem ser identificadas no cenário de trabalho contemporâneo, seja no mundo empresarial, no serviço público, no trabalho informal, etc. Uma delas, a violência psicológica, tem sido objeto de estudos constantes quanto ao impacto na vida do trabalhador, principalmente na forma de assédio moral, no qual iremos nos ater.

O assédio moral se configura quando a dignidade ou integridade psíquica ou física do trabalhador é atacada mediante condutas constrangedoras (gestos, palavras, comportamento, atitude) realizadas de modo repetitivo e sistemático durante um período prolongado de tempo. Tal assédio pode se manifestar de maneira vertical (praticado por uma chefia contra seu subordinado, ou um grupo de trabalhadores contra sua chefia) e horizontal (em que os ataques ocorrem entre colegas de trabalho de um mesmo nível hierárquico).

O assédio também pode assumir a forma interpessoal – quando as ações são direcionadas a alvos específicos (geralmente entre duas pessoas ou entre um grupo e uma pessoa), com o objetivo de excluir, isolar, desqualificar profissionalmente, desestabilizar emocionalmente, ou ainda estimular demissão ou transferência por parte da vítima – ou a forma organizacional/coletiva – quando é destinada a atingir um grupo de funcionários, em que o assediador é respaldado pela empresa/instituição que estabelece de forma explícita ou velada, uma política gerencial de normas e valores considerados “normais”, mas que trazem em sua raiz a imposição de sobrecarga de trabalho e aumento da lucratividade a todo custo, como o cumprimento de metas abusivas, supervisão excessiva, premiações constrangedoras e até o controle no tempo de uso do banheiro.

Para a vítima, a perda do sentido e interesse pelo trabalho podem ser desencadeados em decorrência das situações de assédio, além de diversas consequências em saúde como alterações no sono (insônia, pesadelos), cansaço, irritação constante, tristeza, angústia, diminuição na capacidade de concentração/memorização, crises de choro, redução da libido, dentre outras queixas. Tais sintomas podem ocasionar quadros mais agravados em saúde mental, como a depressão, transtornos de ansiedade, uso abusivo de álcool e drogas e tentativa de suicídio.

É importante salientar que questões pessoais podem afetar o desempenho no trabalho de determinada pessoa; porém, é fundamental a compreensão de que o inverso também ocorre, isto é, as condições vivenciadas no cenário laboral podem interferir sobremaneira nos mais diversos contextos de vida do sujeito, em especial no ambiente familiar. Sendo assim, é destacável os efeitos deletérios do assédio moral de forma ampla na vida do trabalhador.

Para que as consequências sejam suprimidas ou amenizadas, é importante que a vítima ou pessoas ao seu redor possam se mobilizar a fim de denunciar os fatos ocorridos. Atualmente a prática do assédio moral pode ser provada por meio de recursos tecnológicos e físicos como bilhetes, documentos, e-mails, áudios, vídeos, ligações telefônicas ou registros em redes sociais, além de testemunhas que tenham conhecimento dos fatos. Desse modo, é importante que a vítima anote detalhadamente as práticas abusivas sofridas, contendo dia, mês, ano, hora, local ou setor, nome do(a) agressor(a), colegas que testemunharam os fatos, conteúdo das conversas e o que mais julgue necessário.

Além disso, o acompanhamento em saúde mental para casos de assédio, por via da psicoterapia e outras alternativas semelhantes, torna-se um aliado importante, à medida que promove um espaço de organização e potencialização do sujeito, considerando sua história tanto de vida como ocupacional, e fortalecendo sua autoestima e autonomia para a tomada de decisão.

Como ação preventiva, é importante que as empresas e instituições invistam em uma cultura e espaço de diálogo e confiança com seus trabalhadores, além de manter claras as suas normas e posicionamento frente à temática, de modo a existir canais de sigilo e denúncia contra supostos casos. É essencial ainda que o tema seja inserido no conteúdo de treinamentos para todos, bem como capacitações específicas para gestores.

Embora muitos trabalhadores tenham receio de retaliações ao denunciar casos de suposto assédio, é fundamental o fortalecimento dessa necessidade, dada suas consequências danosas, e dado que é dever do empregador promover um ambiente ocupacional livre de violência e situações discriminatórias, de modo que o trabalho cumpra sua função de potência, de criatividade, de cooperação entre pessoas e de bem-estar.

Referências:

DAHLBERG, L.L.; KRUG, E.G. Violência: um problema global de saúde pública. Revista Ciência e Saúde Coletiva. Disponível em: https://www.scielo.br/j/csc/a/jGnr6ZsLtwkhvdkrdfhpcdw/

MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO. Assédio Moral no Trabalho: perguntas e respostas. Disponível em: https://mpt.mp.br/pgt/publicacoes/assedio-moral-no-trabalho-perguntas-e-respostas/@@display-file/arquivo_pdf

SILVA, Edith Seligmann. Trabalho e Desgaste Mental: o direito de ser dono de si mesmo. SP: Cortez, 2011.

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