Amor Romântico

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Quem me conhece sabe que eu sou uma pessoa muito curiosa e eu estou sempre estudando algum assunto que me provoca. Quando pensei no meu artigo, surgiram dúvidas sobre qual tema seria interessante, vieram muitas sugestões sobre temas que as pessoas gostariam que eu abordasse, mas no fim eu decidi escrever sobre o amor.

Fui inspirada por Regina Navarro Lins – psicanalista, ex-professora da PUC-RJ, palestrante, escritora e colunista, autora do livro “Novas formas de amar”, Ed. Planeta, 2017 – que dedicou seu tempo aos estudos da história do amor e do sexo ao longo dos últimos 5 mil anos.

Lins (R. N., 2017) defende a ideia de que o que chamamos de amor não existiu desde sempre, mas é uma construção social, que varia de forma, de significado e de valor. Critica a ideia do amor romântico, cujas principais características são: a idealização da pessoa amada e a projeção nela de tudo que gostaria que ela fosse. Atribui à pessoa características de personalidade que na verdade não possui, não se relacionando com a pessoa real, mas sim a inventada de acordo com as próprias necessidades. Esse tipo de amor não resiste à convivência diária do casamento, porque a excessiva intimidade leva à obrigatoriedade de enxergar o parceiro como ele é, não dando espaço para a sustentação da idealização. “O desencanto é inevitável, trazendo, além de tédio, sofrimento e a sensação de ter sido enganado. Quando percebemos que o outro é um ser humano, e não a personificação das nossas fantasias, nós nos ressentimos e geralmente o culpamos” (p.24).

Desde a invenção do cristianismo, o amor só podia ser dirigido à Deus. O que existia era o desejo sexual e a busca de sua satisfação. Por volta do século XII surge o amor cortês, a primeira manifestação do amor como hoje o conhecemos. Só a partir do século XIX esse ideal amoroso passou a ser uma possibilidade no casamento, que até então só se davam por interesses econômicos e políticos. E a partir de 1940 apareceu como fenômeno de massa, incentivado pelos filmes hollywoodianos. 

Para a autora não existe nada de grave em desejar um par amoroso, a questão é acreditar que só se pode ser feliz se houver esse par amoroso. 

A fusão proposta pelo amor romântico é extremamente sedutora. Nos contos de fadas, por exemplo, os heróis e heroínas precisam superar inúmeros obstáculos para conseguir ficar juntos no final e como garantia de que continuarão apaixonados eternamente, findam com o clássico “e viveram felizes para sempre”. Até o século XIX, o amor romântico arrebatava os corações, mas não podia se misturar com a relação fixa e duradoura. As histórias de Tristão e Isolda, Romeu e Julieta, ilustram como esse amor é regido pela impossibilidade; quanto mais obstáculos a serem transpostos, mais apaixonada a pessoa se torna.

“Imaginar que numa relação amorosa vamos nos completar, que nada mais vai nos faltar, é o caminho mais rápido para a decepção” (Lins, 2017, p. 29).

Com a convivência do dia a dia vamos percebendo no outro aspectos que nos desagradam, fica difícil manter a idealização e a partir daí, para manter a relação, inúmeras concessões são feitas. A relação vai ser tornando sufocante com a quantidade de frustrações que se acumulam e cresce a aspiração pela liberdade.

Lins (R. N., 2017) argumenta que esse tipo de relação está com os dias contados, embora muitos discordem. 

“Acreditam que sem uma relação amorosa tipo romântica – fixa, exclusiva e duradoura – não se pode ter uma vida satisfatória. Esse modelo imposto de felicidade, além de não corresponder à vida real, gera sofrimento por induzir as pessoas à busca incessante pelo parceiro idealizado. 

Ocorre que estamos no meio de um processo de profunda mudança de mentalidade. A busca pela individualidade caracteriza a época em que vivemos. A grande viagem do ser humano é para dentro de si mesmo. Cada um quer saber quais suas possibilidades na vida, desenvolver seu potencial. O amor romântico propões o oposto disso; prega que os dois se transformem num só, havendo complementação total entre eles” (p. 31).

Muitos devem achar todas essas ideias radicais, mas basta olhar para trás: na década de 50 e 60 era condição para o casamento que a moça fosse virgem. A separação de um casal era uma grande tragédia. Poucas décadas depois, tudo isso é encarado como prática habitual. A mentalidade das pessoas está mudando. Isso fica claro nos novos desenhos animados em que as personagens femininas são fortes e independentes, não buscam um homem para viver um romance e dar significado à sua vida.

Minha proposta com esse artigo não é outra senão refletir sobre as expectativas que colocamos sobre as relações. Como terapeuta, meu trabalho é criar um espaço seguro em que a diversidade de experiências possa ser explorada com compaixão. Não pretendo defender e nem me posicionar contra o amor romântico. Ficar nos termos mais simplistas do julgamento não tem serventia alguma. Escolher uma relação monogâmica e viver toda a vida ao lado de alguém pode ser uma experiência incrível, se soubermos respeitar o espaço e a individualidade do outro.  Fazer outras escolhas, de ter múltiplas relações, também pode trazer momentos de felicidade. O mais importante é ter paz nas escolhas que forem feitas. 

LINS, R.N. Novas formas de amar. São Paulo: Planeta, 2017.

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